Entre Cortinas
Capítulo 1
No cair da noite, quase sem um dia em exceção, eu me encontrava quase imóvel perante a janela, como se algo além de mim mesmo me conduzisse até ali. Do outro lado da rua, as luzes da casa de pedra se acendiam, e, era nesse instante sutil, que meu coração disparava em antecipação — esperando que minha presença pudesse ser pressentida à distância.
As cortinas nunca eram completamente fechadas, ou abertas. Um gesto simples, talvez quase desatento, que me permitia vislumbrar apenas parte da rotina e da movimentação da silhueta da bela solitária.
Não sabia seu nome, nem sua idade, aparentemente solteira. Ela costumava acender a luz por volta das seis da tarde, talvez um pouco antes nas sextas e gostava de plantas, deixando-as nos vasos na varanda, no qual ela sempre as molhava quando já era noite.
Às vezes, eu a via curvada sobre um livro, outras, absorta nas luzes do computador. Havia dias em que ela se divertia com a própria companhia, seja dançando sozinha ou assistindo alguma coisa na televisão. Ela se movimentava com uma graça etérea que me obrigava a prender a respiração, como se qualquer movimento brusco pudesse dissipar a cena que me entretinha.
Vez ou outra, nossos olhares se cruzavam. Raros segundos, rápidos demais para serem chamados de encontros, longos o suficiente para me desestabilizar e fazer meu coração acelerar. E então eu precisava fazer força — uma força interna herculana e sutil — para desviar o olhar com a naturalidade dos que não sentem nada. Fingir que estava olhando o nada, ou apenas a rua casualmente, ou para o céu. Segurava o sorriso, mesmo quando meu peito ardia com a vontade de fazê-lo, como se um gesto mais franco pudesse trair o que guardava só para mim.
Naqueles instantes suspensos, me perguntava se ela me percebia, se eu poderia ter sua atenção, quem sabe o seu coração, ou se ela optava por viver em solidão. Imaginava conversas que nunca teríamos, sorrisos que talvez jamais trocaríamos, e interações que só existiam na minha imaginação.
Eu sabia que eu poderia atravessar a rua, dizer qualquer coisa num encontro forçadamente casual. Um "olá", talvez, um comentário banal sobre o tempo ou sobre o que estivesse em suas mãos. Mas sabia que isso era quase impossível. Ela não era fácil de se aproximar. Ela possuía uma aura que mantinha as pessoas distantes, ou ela mesma distante, quase intocável como uma deusa.
Não era o medo da rejeição que me paralisava — era o temor de destruir aquela doce fantasia que me aquecia nas noites rotineiras e nos momentos de distração à janela.
E assim permaneci, noite após noite, como um espectador anônimo da sua rotina. Um personagem invisível na trama cotidiana dela. Ela era o mistério que a cortina escondia, e eu, o homem que fingia não espiar.
Trecho do livro Entre Cortinas por Nebulah Anne

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